o bairro
Fotografia do Bairro do Alvito aquando da sua construção
(Fonte: Cadernos de Habitação nº 001 da FAUP)
Características urbanísticas e arquitetónicas iniciais
O Bairro do Alvito, situado na freguesia de Alcântara, concelho de Lisboa, foi projetado em 1937 e construído entre 1937 e 1940, sendo o autor do plano e do projeto de arquitetura o Arquiteto Paulino Montez.
A sua construção foi iniciativa da "Caixa de Socorros e Reformas dos Funcionários dos Operários e Assalariados da Câmara Municipal de Lisboa". No entanto, após a conclusão da obra, em 1940, o bairro manteve-se inabitado, degradando-se, tendo sido requalificado em 1943, ano em que o Estado o adquiriu para o integrar no Programa das Casas Económicas. Este programa era baseado num sistema de renda resolúvel, que permitia aos moradores chegarem, após 20 anos, à propriedade plena da casa.
O Bairro apresenta várias características inovadoras para a época e para o contexto português, como a construção de habitação social em altura e a existência de um equipamento de caráter social, potenciador de convívio comunitário.
O Bairro do Alvito apresenta uma organização marcadamente geométrica, organizado segundo um eixo de simetria norte-sul que define ao centro do bairro a localização de um equipamento coletivo e de um pequeno jardim. O bairro cresce em largura e em altura em direção a norte, concentrando a sul blocos de dois pisos com fogos de acesso independente – um ao nível da rua e outro através de uma escada exterior – e a norte blocos de três pisos com fogos de acesso através de uma escada comum.
Os fogos são apenas de duas tipologias, de dois e três quartos, encostando à fachada norte cozinha, instalação sanitária e um quarto, e à fachada sul um ou dois quartos, dependendo da tipologia, e a sala comum, que é o espaço de entrada na habitação.
A imagem exterior dos edifícios é depurada, com linhas retas e com uma reduzida presença de elementos decorativos, limitada ao embasamento e aos relevos no coroamento de vãos e planos de fachada.
Originalmente, as coberturas eram planas, assumindo essa imagem moderna. Por altura da requalificação do bairro, em 1943, são acrescentadas, aparentemente sem intervenção do arquiteto, coberturas em telha, eliminando os terraços.
=> Texto retirado da publicação "Cadernos de Habitação n.º 001 - Bairro de Casas Económicas do Alvito. Mapa da Habitação: Reflexão crítica sobre a arquitectura habitacional apoiada pelo Estado em Portugal (1910-1974). Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto", que inclui uma planta geral do bairro e plantas das várias edificações-tipo (edifício central, moradias unifamiliares e prédios de tipologias T2 e T3):
Projeto de Arquitectura do Bairro do Alvito - peças desenhadas
(Fonte: Cadernos de Habitação nº 001 da FAUP)
Bairro do Alvito - Primeiros Anos de Vida (1930's a 1950's)
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Bairro do Alvito - Imagem Satélite atual
(Fonte: GoogleMaps)
Evolução do bairro e situação atual
O Bairro do Alvito veio a servir, eminentemente, os jovens alunos da 'Escola de Polícias' do Calvário (ISCPSI) e suas famílias, cujos filhos frequentaram a Escola Primária que se instalou como primeira ocupação do edifício central do bairro.
Diz-se que havia disputa, picardia e romance, entre as famílias do lado esquerdo/ oeste do bairro (prédios com números ímpares) e as do lado direito/ este (números ímpares), já que as ruas do bairro não têm nomes atribuídos.
Depois de escola primária, o edifício central do bairro foi biblioteca municipal e, finalmente, equipamento cultural, vindo aí a instalar-se um conjunto de entidades e atividades, a primeira das quais o Ginásio Clube do Bairro do Alvito (espécie de associação de moradores do bairro, que promovia atividades com/ para jovens, entre as quais teatro de revista e bailes - e que agora promove as festas de Santo António, em junho), a mercearia do Sr. Manuel (que serviu o bairro por décadas, estando agora muito degradada), a Capela da Paróquia de São Pedro de Alcântara (com missa a um domingo por mês), a Associação Cultural Lanterna Mágica (de teatro de marionetas, agora espaço de ensaio de bandas e estúdio de gravação de som) e, mais recentemente, a MIAU Associação Cultural (com grupos de teatro profissional, jovem e sénior, sendo ainda espaço de formação e programação artística e sociocultural).
Imagens dos espectáculos de teatro de revista que ocorriam na década de 1950 no edifício central do bairro (Fonte: arquivo pessoal de Lucinda Monteiro, atriz participante da época e moradora do bairro)
Fotografias de convívios juvenis no bairro e de jovens do bairro, nas décadas de 1970 e 1980
(Fonte: arquivo pessoal de João Monteiro, morador do bairro)
Vídeo integrante da exposição final da oficina "Semear o Mundo no Alvito (Verão 2013): Criar e Intervir em Comunidade", que desafiou os jovens a mapear o bairro, entrevistar os moradores, fazer reportagens vídeo-fotográficas e analisar e mostrar os resultados numa exposição final, para a qual todos foram convidados
(Realização do Vídeo de Alexandre Tavares, designer e morador do Bairro e Prédio 'Alvito49')
(Fonte: Arquivo da MIAU Associação Cultural)
Quanto aos prédios, foram sendo mantidos, melhorados e adaptados, à medida das necessidades das famílias, tendo sido delimitados e atribuídos quintais às frações de R/C e 1º andar (ficando os sótãos afetos às frações de 2 andar), o que veio a derivar em distintas apropriações, principalmente dos quintais, agora com desde extensões de casas, anexos/ garagens, jardins/ hortas e até um café - D. Ana).
Em termos urbanísticos e ao nível de intenções futuras, o bairro é abrangido pelo Plano de Pormenor da Pedreira do Alvito, cuja proposta foi elaborada em 2011 pela Divisão de Planeamento Territorial da Câmara Municipal de Lisboa, e que nestes últimos anos sofreu desenvolvimentos e ajustes, estando associado a um projeto de investimento imobiliário previsto para os terrenos da Encosta da Tapada (designação da área da Pedreira), e que agora está nas mãos do grupo chinês EMGI.
Planta de Implantação do Plano de Pormenor da Pedreira do Alvito
(fonte: Câmara Municipal de Lisboa)
Este Plano de Pormenor apresenta um cenário de investimento imobiliário de mais de mil fogos de habitação (além de comércio e serviços) para a área da pedreira. Para o bairro, prevê várias beneficiações, ao nível de pavimentos, circulação e estacionamento viário, redes de água e esgotos, e a reabilitação do edifício central. Propõe também algumas alterações relevantes em termos de mobilidade e acessos, como o desvio da estrada que liga o Bairro a Alcântara (Calçada da Tapada) e a ativação da 'Estação Ferroviária de Alvito-A', interface inativa da Linha do Sul, situada a 400 metros a sudeste do Miradouro do Bairro do Alvito.
Não sendo fácil visualizar este futuro, menos se nos afigura sustentável à luz das atuais circunstâncias. Os anos de 2020 e 2021 poderão marcar uma viragem na abordagem ao planeamento urbano, especialmente nas cidades, propondo modelos (e até usos) alternativos.
Um bom exemplo seria a transformação da pedreira num gigantesco lago artificial, canalizando (e tratando) a água da chuva para: recreio da população ('piscina natural' ao ar livre, em complemento à atual piscina municipal do alvito), irrigação e reflorestação de terrenos circundantes ('plantar a água' em 'florestas comestíveis'), abastecimento às populações (rede de águas pluviais) e abastecimento em casos de seca extrema/ falta de água, incêndios e outras situações de emergência.
Uma luxuriante floresta comestível com um grande lago, cascatas e ilhas flutuantes - e o maior tesouro 'guardado a céu aberto' na freguesia (que é o que a água é e será, com mais ênfase, em qualquer parte do nosso planeta, assim no-lo dizem os cientistas nos seus cenários climáticos para os próximos 20, 50 e 100 anos) - isso, sim, uma visão de (e com) futuro.
O Bairro do Alvito está ainda inserido na 'grande mancha' verde do Parque Florestal de Monsanto (PFM), próximo aos Campos de Ténis da ATL, aos 100 hectares da Tapada da Ajuda do ISA, ao Parque Infantil do Alvito e à zona verde do Miradouro do Bairro do Alvito, recentemente intervencionada pela Câmara Municipal de Lisboa, com a criação de um caminho pedestre a ligar o bairro ao resto da freguesia de Alcântara.
Sendo que o bairro é delimitadamente excluído da área de regime florestal, confina com esta. Cremos que a proximidade à floresta constitui um critério chave para aqueles que escolhem aqui habitar e que, por isso mesmo, seja inevitável que a comunidade do bairro desenvolva mais apuradamente valores, princípios e práticas de respeito, proteção e corresponsabilização por este tão importante património natural da nossa cidade.
Potencialmente, todo o bairro poderá ser um ativo 'vigilante da floresta'. E potencialmente, também, toda a floresta do PFM poderá ser um exemplo de sustentabilidade em ação na cidade.
Planta do Parque Florestal de Monsanto e localização do Bairro do Alvito
(Fonte: Câmara Municipal de Lisboa)
Mais e interessante...
- O Bairro do Alvito tem ativa, desde 11 de dezembro de 2016, uma página de comunidade na rede social facebook.
- O Bairro do Alvito está inscrito no SIPA (Sistema de Informação do Património Arquitectónico) da Direção-Geral do Património Cultural, com o a ficha de registo nº 12686. Interessante ler sobretudo a cronologia e perceber que os terrenos foram adquiridos (em 1937) por 1.500 Contos (7.500 Euros), tendo a obra custado 2.700 Contos (13.500 Euros). Se se registar no SIPA poderá votar e comentar este 'monumento'. Ao visitar a página estará a contribuir para aproximar o Bairro do 'Top 100 do Património' :))
- A ler, definitivamente, o documento "HABITAÇÃO: 100 Anos de Políticas Públicas em Portugal (1918-2018)", elaborado com o apoio da Direção de Estudos, Planeamento e Assessoria do IHRU (Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana), e que menciona o Bairro do Alvito (página 21).